Que nosso estimado Monteiro Lobato era racista, ninguém pode negar! Mas ele vem de uma época em que o racismo não era crime e fazia parte da nossa cultura. Muitos que lutaram pela abolição da escravatura, apesar de defenderem os negros, jamais permitiriam que seus filhos se casassem com um. Aliás, até nos dias de hoje se vêem muitos desses defensores que torceriam o nariz para um genro ou nora negros. Difícil é admitir para si mesmo – para os outros é inadmissível e passível de punição legal – que se é preconceituoso.
Lobato escreveu uma carta ao seu amigo Tito, em 1905, onde dizia “ser impossível civilizar e corrigir o povo brasileiro, devido ao fatalismo das inclinações, dos pendores, herdados com o sangue e depurados pelo meio.” E ainda, “que apenas uma injeção de sangue da raça mais superior (ou seja, a emigração oriunda de países europeus) asseguraria o futuro do país.” Se esta carta, onde chama de "patriota" ao brasileiro que se casasse com "italiana ou alemã", fosse interceptada nos dias de hoje, ele seria, indubitavelmente, processado e suas obras condenadas à poeira do esquecimento. Graças a Deus ele era um racista que podia ser racista, pois apenas refletia o pensamento de sua época! Caso contrário não conheceríamos o Pedrinho, a Narizinho, a “Macaca de Carvão”, quer dizer, Tia Anastácia , ou ainda meu querido Jeca Tatu!
Basta observamos as manifestações contra nordestinos publicadas na internet logo após as eleições, para constatar que quase um século depois do nosso saudoso escritor, ainda vemos pensamentos como o dele na época. Sou capaz de garantir que ele já teria revisto seus conceitos e revisado algumas de suas obras, principalmente, O Presidente Negro - O Choque das Raças (1926) se ainda vivesse. Ah, se ele visse Obama!
O livro infantil Caçadas de Pedrinho, publicado em 1933, relata uma expedição organizada pelos nossos heróis Pedrinho e Narizinho...
em busca de uma onça, descoberta pelo Marquês de Rabicó, que andava rondando as proximidades do Sítio do Picapau Amarelo. Durante a caçada, eles encontram Quindim, um rinoceronte falante, e decidem trazê-lo para morar no sítio. O trecho que sugeriu que queriam que os livros fossem retirados das prateleiras das bibliotecas escolares diz o seguinte: "Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão…" Alimentado pela mídia cínica, o racismo de Lobato volta a ser tema de discussões!
O Conselho Nacional de Educação, cujas atribuições são normativas, deliberativas e de assessoramento ao Ministro de Estado da Educação, através do parecer da conselheira relatora Nilma Lino Gomes, aprovado por unanimidade em setembro, só exigiu a inserção de nota explicativa na edição de “Caçadas de Pedrinho” para alertar sobre a presença de estereótipos raciais na obra, auxiliando o trabalho dos professores em sala de aula. Em momento algum, ao contrário do que vimos publicado na imprensa, foi sugerido que o livro da editora Globo fosse proibido de ser distribuido nas bibliotecas escolares. Também não foi só o trecho em que Tia Anastácia é chamada de “macaca de carvão” que contribuiu para este parecer. Entre outros estereótipos na obra, a personagem Emília refere-se ao iminente ataque de onças e animais ferozes ao sítio: “Não vai escapar ninguém — nem Tia Nastácia, que tem carne preta”. Se a carne preta de tia Anastácia deveria ser dispensada pela onça na visão de Monteiro Lobato, não existe dúvida de que estamos diante de alguém que considerava o negro uma raça inferior, o que não quer dizer que não gostasse deles. Não seria necessário ler O Presidente Negro, ou Urupés, para perceber isso. Aliás, como já explicitado acima, Lobato nunca negou isso. Nem tinha porque negar já que na época estas praticas racistas não eram criminosas. Mas hoje são, e se eu ler uma história destas para meus alunos, sem qualquer menção ao pensamento preconceituoso da época, estarei certamente contibuindo para a difusão de práticas que se luta anos e anos para extinguir de nossa sociedade. Não estamos falando em um livro para estudantes do ensino médio ou universitários . Estamos falando em um livro para crianças, cujo pensamento crítico está em plena formação.
Quer um conselho? Esqueça o Monteiro Lobato racista e dedique-se apenas aos seus personagens engraçados, divertidos e envolventes. As vezes é melhor fugir da realidade que ser obrigado a discutir polêmicas que em nada refletem o interesse real com a educação dos nossos brasileirinhos. Polêmicas que nunca existiriam de fato não fosse o interesse cruel em denegrir as Instituições Públicas.
Lembrando que no Brasil, caçar onça pintada também é crime, estamos diante de uma obra riquíssima em elementos para questionamentos acerca do massacre da onça pintada, promovido por fazendeiros e sitiantes, além é claro, da possibilidade de levar nossos alunos a uma reflexão sobre a questão racial, o pensamento preconceituoso e as atitudes discriminatórias. O gênio Monteiro Lobato não poderia imaginar que suas contibuições literárias chegariam tão longe!
Um ótimo dia de reflexões acerca da “Consciência Negra” para você também!
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